8/01/2021

Maria Cecília

 

Ela dizia que eu sou louco por agradecer a torradeira por ter feito as torradas perfeitamente.

-Você sabe que os objetos não ouvem. Por que você não me agradece quando eu faço seu almoço?

Eu agradecia todas as vezes, mas ela não ligava. Ela não queria que eu agradecesse e sim que eu elogiasse o macarrão sem sal. Eu dizia:

-Macarrão é massa e tomate é fruta!  Se não colocar sal o prato fica doce!

Então terminamos nosso namoro.

...

-Muito obrigado pelos sessenta minutos de prazer que você me ofereceu!

-São duzentos reais

Agora eu agradeço as prostitutas pelo sexo, ao microondas pela comida, ao meu gato pelo carinho e Maria Cecília não me faz mais falta nenhuma!

12/21/2019

Capitã Aranha


A voz dele nunca soou tão fria, chegou me dar arrepios. “Cala a boca, Bianca”, papai disse. Mas eu amo ele mesmo assim. Meu pai é bem bravo, mas não é sempre. As vezes ele me dá presente, sempre traz um doce quando vai ao mercado. Ele só não gosta muito de quando eu tento brincar com ele, mas ele vive dando sorrisos quando eu mostro meus desenhos pra ele. Ontem eu desenhei um homem aranha, conforme vi no celular, e ele riu bastante. “Você quer ir no cinema, não é?” ele disse. Respondi que sim.
Agora estamos no estacionamento do shopping center, está de noite. Acho que é a primeira vez que eu saio com papai a noite, ele vai me levar no cinema assistir o homem aranha no aranhaverso porque ele sabe que eu gosto de super heróis e vou fazer o meu aniversário de nove anos semana que vem. Já pedi decoração da mulher maravilha, acho ela linda.
Ele olhava o celular toda hora, me segurando pela outra mão. Ele perguntou se eu queria comer alguma coisa antes, e a gente foi no Burguer King e eu peguei de brinde um copo sem graça. Eu queria o boneco da capitã Marvel que tinha no Mc donalds mas meu pai fala que o lanche de lá é feito com minhoca e dá dor de barriga. Daí ele come o lanche vegetariano do Burguer King e chega em casa com dor de barriga mesmo assim.
Depois do lanche eu pedi um sorvete, mas ele falou que a gente compraria quando fosse embora. Fomos no cinema comprar o ingresso, e o papai mostrou minha carteirinha da escola para pagar menos, ele sempre faz isso mesmo. Daí ele queria ir no banheiro, mas o do cinema não podia entrar porque só quando fosse ver o filme. Daí a gente foi no banheiro do outro lado do shopping.
Não faz mal, na verdade eu gosto de olhar as vitrines e faltava bastante tempo pra começar o filme. Meu pai estava mais quieto que o normal. Para tudo que eu falava ele repetia “seu aniversário está chegando, se eu comprar algo hoje não vou ter dinheiro pro seu presente”. Ele disse que ele e mamãe estavam planejando uma surpresa, que eu não poderia saber o que é, mas que por isso não podia comprar nada. “não vou te deixar sozinha aqui, você entra no banheiro comigo”, ele disse. “Não vou te deixar sozinha no banheiro masculino, você entra na cabine e fica de costas. Não faz mal também, é bem ruim ficar sozinha no banheiro masculino então eu entrei com meu pai na cabine, ele ficou de costas pra fazer xixi, mas também não faz mal porque eu já tomei banho com papai. Nada de novo sob o sol.
Nós fomos assistir o filme. O Miles Morales é muito legal, ele tem um cabelo feito o meu e namora a Gwen Stacy que também tem poder de aranha. Aparece no filme o pai dele que é muito parecido com o meu pai e o porco aranha. O porco aranha é muito engraçado, ele é um desenho 2d  num filme de 3d. Eu fiquei imaginando que eu era parte do filme, jogando teia pela cidade. Numa cena em que ele estava em cima de um prédio, meu pai falou “olha, parece a visão da nossa sacada” e era bem parecido mesmo. A Gwen Stacy do filme é bonita igual uma menina da minha escola.
Ai, quando o filme acabou eu quis chorar, mas segurei. Meu pai parecia estar entediado no começo, mas ele se mexeu bastante nas cenas de ação do final, chegou parecer que  ele ficou mais nervoso que eu pra ver o que acontecia com o Miles Morales. Acho que ele se interessou quando viu o pai do Miles.
“Sabe Bia, eu acho que também sou um pai de super-herói”. Eu não entendi, mas ele me explicou que me amava e que eu ia ser muito boa quando crescesse. Eu tirei uma foto com o cartaz do filme. “Finge que você é a Gwen!”, ele disse, e eu fiz a mão de teia pra foto. Fomos tomar sorvete.
Agora que eu parei pra pensar, porque meu pai tomava o sorvete dele em silêncio. Acho que meu pai não gostava daquele shopping porque ele já trabalhou lá como segurança, e daí demitiram ele. O cinema ficava no terceiro andar, eu gosto de ficar olhando lá pra baixo. Papai quis ir no banheiro de novo. “já sabe né?” ele disse. Entrei com ele, mas dessa vez ele não ficou de costas. Ele se sentou no vaso, ainda com as calças, me abraçou e me beijou na boca.
Quando meu pai parou de me beijar, ele disse que conhecia algo legal naquele shopping.  Ele ia falando “acho que todo mundo pode ser um herói se acreditar bastante”, e também sobre como eu tinha potencial e como ele parecia com o pai do Miles Morales. Eu falei que queria poder ter os poderes do aranha, e ele falou que eu podia. Nós chegamos no canto do shopping que dava pra ver tudo. Lá de cima eu enxergava todas as lojas, as pessoas. Meu pai me pegou no colo.
Do colo dele eu ficava mais alta para ver as coisas. Me imaginei com os poderes de aranha, balançando minha teia entre os andares, puxando com a teia o sorvete de um menino branco no segundo andar. Imaginei tão forte que eu enxergava as teias e dava cambalhotas no ar, de um lado pro outro.
A música do filme tocava na minha cabeça. Quando chegar em casa eu vou tentar descobrir o nome. Eu fazia uma cama elástica com teia e deixava meu corpo cair, a teia descia até quase no chão, e me jogava pra cima de novo. Eu chegava perto do teto do shopping, e caía de novo. Na terceira queda, cheguei a sentir o ventinho batendo no meu rosto. Foi nessa hora que levei um susto.
Quando olhei para baixo, para a cama elástica de teia, ela sumiu. Lá em baixo havia uma menina, deitada, estirada, vestindo uma roupa como a minha, mas toda lambusada de sangue. Quando vi, me desesperei por alguns segundos, parada no ar. Logo passou, e eu percebi que estava flutuando. Meus poderes não eram de aranha, eu podia voar como a capitã Marvel. Eu passei a dar piruetas, e subi até o terceiro andar. Lá eu vi meu pai, correndo, com o rosto sério. Quando ele fez a curva da loja de roupas eu fui atrás dele dizendo “papai, olhe pra mim, eu sei voar”. Ele não me ouvia.
Quando meu pai viu um outro homem, um velhinho de bigode, ele se aproximou e colocou  as mãos no rosto, chorando. “Por favor, minha filha se jogou lá em baixo por causa do filme do homem aranha”.  Eu continuei voando, até o teto, mas papai não me ouvia chamar. O velhinho disse que procuraria por ajuda, e quando saiu, meu pai parou de chorar.


8/22/2019

Aeroporto



-Aquele pessoal do check-in é muito mal educado, jogaram minha mala de qualquer jeito, espero que não quebrem meus perfumes, nunca que encontrarei no Brasil um perfume como aquele, gosto muito de perfumes.
Ao olhar para trás, a jovem Jolene ficou surpresa. Uma mulher que devia estar chegando aos cinquenta lhe dirigia a palavra querendo socializar. A jovem, sem resposta pronta, não queria ficar em silêncio para não parecer rude com a mulher. Porém, a surpresa do ato fez com que respondesse:
-Sim, sim, percebo que a senhora cheira bem!
Oh deus, porquê querida Jolene respondera daquela forma? A mulher que já era carente, agora entendia isso como um elogio, trataria Jolene com mais carinho com que trata suas próprias filhas.
-Esse é um Shalini, realmente maravilhoso. Vejo que é uma moça bem comportada e de bom gosto. – Jolene respondeu com um sorriso simpático e cordial- seu rosto me lembra minha filha mais nova, você é muito bonita mesmo. Reconheci que é brasileira pelo chaveiro na bolsa. O que faz na França?
De fato, Jolene tinha pendurado na bolsa um chaveiro que misturava as bandeiras dos dois Países, formando uma bandeira cortada na diagonal, com a bandeira Brasileira á direita, a Francesa à esquerda.
-Eu vim para visitar uma irmã que faz douturado aqui, aproveitando para conseguir matrícula em uma universidade.
-Nossa, mas que interessante”  – A senhora exclama enquanto  tira o chapéu, mostrando seus cabelos pintados de loiro -  O que vocês fazem, você e sua irmã? Fui professora de Genética por muito tempo em uma universidade carioca, até que encontrei um marido rico. Será que esse embarque demora? O avião vai se atrasar, e nós nem estamos no Brasil.
Antes que a jovem respondesse, um movimento chamou atenção das duas um pouco mais a frente da fila de embarque. Um homem mais velho, alto, corcunda e careca, discutia em inglês com um rapaz de camiseta de animé japonês.  Ao que tudo indica, o velho estava incomodado com o fato do rapaz assistir a um vídeo no celular, sem usar fones de ouvido. O velho teria batido na mão do jovem, derrubando o celular, e eles teriam um grudado no pescoço do outro. Agora, outras pessoas separavam os dois enquanto um policial e um dos seguranças do aeroporto vinham correndo de longe.
-Mas que infortúnio! Nem parece que estamos na Europa!
-Sim, sim. – Respondeu jolene.
-Mas você ainda não me disse o que fazem você e sua irmã.
-Ela estuda química na Pierre Marie Currie, eu estou tentando entrar na Bourdeaux, uma pós graduação de medicina.
-Jovem, bonita e culta. Você é uma mulher de causar inveja, me lembra minha juventude, eu só não era tão bonita – Disse a senhora, dando uma piscadinha nada discreta e um sorriso de boca aberta – Mas ainda assim, graças a Deus, consegui amarrar meu marido. Veja só, aqueles dois irão se matar!
Os homens voltavam a discutir alto, em inglês. O segurança do aeroporto tentava apaziguar a situação enquanto o policial já parecia ter perdido a paciência. Um clamava o direito de não ser perturbado, o outro pedia o direito de proteção a bens privados. As duas brasileiras assistiam em silêncio. Conforme o policial retirou os homens, a fila andou dois passos e uma funcionária do aeroporto começou o embarque.
-Sempre deixo meus documentos a mão nessa bolsinha, nunca se sabe. Assim posso deixar tudo na mala de mão e poupar tempo no detector de metais.
-Sim, sim. Eu também.
-Como queria que minhas filhas fossem como você.
A fila andou mais um pouco. Jolene passou pelos detectores de metal sem impedimentos e entrou na sala de embarque. Logo veio a mulher. No avião, estavam separadas. Ao lado de Jolene se sentou um homem que dormia com a gravata afrouxada para respirar melhor.
Sras. e Srs., solicitamos que afivelem cintos de segurança. À partir deste momento é proibida a utilização de qualquer equipamento eletrônico. “
Cansada da viagem, Jolene cochilou assim que o avião decolou.
“temos algum médico a bordo? Repito, temos algum médico a bordo?”
Jolene se inclinou para a frente, ainda sem entender o que acontecera. Uma aeromoça demonstrou interesse enquanto a jovem levantava a mão.
-Eu sou médica!
-Que bom!, tem uma senhora passando mal na primeira classe.
A primeira coisa que a médica fez ao se aproximar, foi pedir espaço e tirar o chapéu da senhora., revelando seus cabelos loiros. Jolene passou a mão pelo rosto de sua colega de fila. Ela suava frio, respirava com dificuldade.
-Ela reclamou de dores no peito e formigamentos - Disse a aeromoça, trêmula.
Jolene abriu a blusa da senhora e pôs a mão no peito. O coração batia fervorosamente. Arritmia Cardíaca. Ela tinha um infarto.
-Tente ficar calma, senhora. Converse comigo. Alguém tem duas aspirinas? Qual seu nome?
-Elizabeth, minha filha. Me chamo Elizabeth.
-Preciso que a senhora fique calma, tente respirar tranquilo. Converse comigo
Alguém chegou com aspirinas,  mas a essa hora, Elizabeth começava a ter alguns espasmos estranhos. Jolene tentava massagear o peito, mas de nada adiantava.
Subitamente sumiram os espasmos e a tremedeira, a respiração forçada deu lugar a uma respiração lenta. Erguendo a cabeça para cima, Elizabeth soltou, junto com seu último sopro, a frase “eu te amo”.
Jolene caiu em pranto no colo da mulher.




6/27/2019

Para um pai que perde um filho, um filho que ganha o mundo.

4/23/2019

cayman


- Cara, eu tô te dizendo. O Volkswagen Virtus é um carro pobre
-Não é não” - Disse o outro jovem, sentado ao banco de passageiro do Porsche Cayman 2019 dirigido pelo amigo de infância. - “É um carro razoável, consegui um bom preço, é um carro que vai cumprir com as tarefas que eu preciso na empresa, e que tem seu diferencial pro público. Você sabe que a volks é dona da Audi, da Man e até da porsche, né? É praticamente a mesma merda. Ele é bonito e o público gosta disso”.
-Mesmo assim, cara. Ele é um carro que não tem o que os carros de luxo devem ter, mas é vendido como se fosse luxuoso. É praticamente um cospobre do audi A3. E se fosse assim, a Fiat também tem a Chrysler. Porque você não comprou um monte de uno 2012 pra sua frota?”
-Não cara, é totalmente diferente. Sabe quem mais comprou Virtus? A Raquel. Aquela menina que o rogério gosta”
-Ele ainda gosta dela? É gado demais. Não vai me dizer que existe Volks Virtus Rosa.”
-Não existe, mas ela mandou pintar, Sabia que a mãe da Raquel obriga ela vender mary kay? A mãe diz que isso vai ensinar a filha ser responsável, comprou um virtus, pintou de rosa, colocou cílios no farol e adesivo da mary kay. Por isso que sempre que o rogério chama ela pra sair, é pra ir no carro dele”
-Raquel não é o tipo de mulher pra andar em virtus nem em nissan kicks, Quer saber? O Nissan kicks é um carro de filho da puta. Todo mundo que tem é filho da puta, digo pelos meus vizinhos. Aquele que bateu no meu porsche tem um kicks, o médico metido tem kicks, até a dona Ana tem kicks, ganhou do filho dela.
- Tá, mas continua falando da raquel.
- Ela é mulher de andar em porsche. Eu adoraria colocar ela aí no seu lugar, fazer ela chupar meu pau o caminho inteiro. O rogério não merece uma mulher daquelas.
Nesse momento, João roberto, o dono do porsche cayman 2019 que foi um presente de aniversário dado pelo pai, pisou no acelerador até a metade e trocou de marcha. Do lado de fora só se podia ouvir o ronco do motor de tração traseira. Dentro do carro, o choro do motor parecia mais um gemido, predominava o rap “Thrift Shop” do Macklemore e Ryan lewis.
- Mas assim, acho escroto vocês dizer isso. Ele te considera um amigo, sabia?
-Cara, agora eu tenho um porsche. Pau no cu  do Rogério e da Raquel.
-Você não acha que esse negócio de carro tá te subindo à cabeça não, joão roberto?
A frase irriitou o motorista João Roberto, que pisou o pé até o fundo no acelerador. João trocava de marcha com uma rapidez incrível. Ele ainda subiu o volume da música.
-Voc~e ainda gosta da Raquel? João Roberto.
-Eu? nunca. ela já está suja pelo bosta do Rogério.
O Porsche roncava, a 140 km/h na estrada.
-Não minta, robertinho. Sua voz não me engana. Você morre de ciúmes do Rogério. Ei! Freia esse carro. Você vai levar multa.
No sentido oposto da via, um caminhão, volkswagem 9150.
-O que a Raquel disse pra você?
-Que preferia o Rogério falido do que você. Que sua arrogância a enoja.
-Quando ela disse isso?
-Bom, eu preciso te contar que almocei lá, semana passada.
O passageiro não podia ver a lágrima que escorria pelo rosto de João roberto. Abriu as janelas do carro. O Barulho do vento á 160 km/h era irritante. Não importa.
João roberto sabia que havia sido traído, que tinha sido quase namorado de Raquel, mas um comentário fora de hora a fizera considerá-lo um infantil sem coração. No mesmo dia em que terminou com ele, a garota procurou por Rogério, agora um ex-amigo.
Sentado ao banco de passageiro do porsche, um intermediário, que não merecia a vida de fofoqueiro e denunciador.
João roberto girou o volante, e enfiou o porsche debaixo do volkswagem 9150 vermelho
-Freia esse carro, João Roberto. - O passageiro tentou puxar o freio de mão, que apenas fez um alto estalo antes de todo o carro se enfiar pelo caminhão.
“Volks beijando outro Volks” Foi o último pensamento do passageiro


“Corno filho da puta, vai morer comigo”. Foi o último pensamento do motorista.
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8/19/2018

Dani

-Filho, é uma festa de adultos.
Daniel sabe que não é a primeira vez que os pais precisam passar uma noite fora, “porque é importante”. O problema de verdade é que dessa vez Dani, como a mãe prefere chamar, não terá o irmão mais velho cuidando dele.
É importante, envolve o emprego do papai” - disse a mãe de Daniel. - “E vai ser tão chato, não vai ter ninguém da sua idade”.
Mas Léo, o irmão de Dani, ele sim era grande o suficiente para ir á festa. Quatro anos mais velho e com síndrome de Down, Léo é dotado de um carisma inocente que encanta os corações mais sensíveis e amedronta os corações mais rígidos.
O que Dani ainda não entendia, é que a presença do irmão na festa chamaria todas as atenções (e toda a pena) para o pai dos garotos, que assim garantia uma promoção seguida de aumento de salário.
Mas Daniel só conseguia entender tudo isso como uma situação muito confusa. De um lado, era velho o suficiente para ficar sozinho em casa, pela primeira vez por uma noite inteira. De outro lado, os pais achavam que ele ainda era só uma criança birrenta e que em uma festa só traria aborrecimentos. Na cabeça de Dani, os ciúmes do irmão se misturavam com a sensação de pequenez e impotência. Estava zangado com os pais mas não queria passar tantas horas sem saber deles.
Nunca imaginei que um filho com Down daria menos trabalho que um Daniel”
A frase dita pelo pai, ecoava na mente de Dani esses últimos dias, até que a família entrou em um carro Volkswagen e foi embora para a festa.
De qualquer modo, Dani precisava se distrair por uma noite inteira.
Não demorou para surgir uma ideia de como ocupar o tempo.
-Coisas de Adulto. Porque eu sou sim grandinho o suficiente.
Mas o que adultos fazem?
Daniel já tinha assistido pornografia antes. Não seria nada de muito novo, mas o garoto decidiu experimentar mesmo assim.
Garota nua ensaio sensual de nudes”
A pesquisa durou um minuto e meio, o tempo que o garoto levou para ter um orgasmo mecânico enquanto massageava a cabeça do penis, repetindo “vai safada, gostosa”, porque a adrenalina de falar essas palavras em voz alta o animou muito.
Com gotinhas de esperma escorrendo pelo shorts, Daniel foi para a cozinha. Poderia fritar um ovo, mas isso também não era novidade. Há anos a mãe o ensinara a fritar ovos. Além do mais, era o dia de fazer coisas de adulto.
O garoto preparou um prato com saladas e grãos, porque era comida de adulto. Com duas colheradas o garoto se convenceu de que estava satisfeito e jogou toda a comida no lixo. Sentiu sede.
Queria beber algo que só os adultos bebessem, e não teve dúvidas. Na sala de estar, em um armário alto, o pai de Daniel e Léo guardava garrafas de elixires proibidos para crianças. Vodca Smirnoff, uísque Scotch, vinho vermelho. No entando, o que o garoto queria mesmo estava na porta mais baixa do armário. Se bebesse qualquer coisa na estante de cima, o pai sentiria falta no outro dia. Mas atrás da porta de madeira haviam garrafas e garrafas das bebidas mais baratas. Aguardente e vodca, algumas garrafas já pela metade, outras fechadas. Ali era possível se deleitar sem ninguém perceber.
Daniel escolheu uma vodca, porque a bebida parecia água, “então deve ser mais fraca”, e o rótulo era azul, cor favorita do menino.
Sentado no sofá, Dani abriu a garrafa e sentiu o cheiro do alcool. Reagiu com náusea, mas a careta logo deu lugar á expressão de curiosidade. O primeiro gole, que na verdade foi um gole bem grandão. O alcool evaporado saia pelas narinas ao mesmo tempo em que tudo queimava no sistema digestivo de Dani.
É muito ruim, mas só um gole deve ser pouco”
Outro volumoso gole se sucedeu. O terceiro, para a surpresa de Dani, não trouxe desconforto nenhum. Fechou a garrafa e a colocou de volta no lugar.
Imediatamente o garoto passou a se sentir fora de si. Não sabia se podia ser tão rápido, talvez fosse a Adrenalina ou algum efeito psicológico. Mas Dani sentiu algo que nunca tinha sentido antes, e isso era demais. Começou a ficar tonto, mas não percebeu bem.
Hahaha. Eu sou demais. Garota nua nudes”
Após um breve cochilo, Daniel acordou no chão da sala. Já eram dez da noite. Devagar se lembrou de ter comido salada e bebido vodca. Era gostoso. Sentiu vontade de beber mais. Dessa vez optou por cachaça. Achou ela pior que a vodca, mas com algo de doce no final.
eu me lembro que o professor disse que o Léo tinha idade mental de metade da idade que ele tem” -o garoto procurou por um bloco de anotações -”dezesseis dividido por dois”.
O garoto não percebia sua caligrafia tremida, escrevia e raciocinava com facilidade, porém com lentidão.
A idade mental dele é de oito anos. Então mesmo ele sendo quatro anos mais velho na idade eu sou quatro anos mais velho da cabeça. Eu deveria estar naquela festa”
Eu sou um ninja”. O garoto gargalhava escondido atrás da árvore, enquanto assistia o vizinho chegar do trabalho. “Dar um susto vai ser divertido, ele nem vai me ver”.
De trás da árvore, Daniel arremessou um ovo em direção ao vizinho, e se escondeu.
Ainda zonzo pelo alcool, o ovo se espatifou na lixeira pŕoxima ao vizinho.
O que Daniel não sabia é que o vizinho, irritado, ouvira suas gargalhadas, viu o arremesso do ovo e viu o garoto correndo para dentro de casa.
Na consciẽncia de Daniel tudo tinha acontecido furtivamente e o vizinho super confuso tentava descobrir o que aconteceu. “Está chovendo ovos, ahahahhaha”
cinco minutos se passaram, e não havia sinal de nenhuma alma viva em toda a rua. O menino bêbado se aproximou da casa do vizinho, espiou pelas frestas do portão, procurando pela localização das janelas.
Com um forte estalo, outro ovo espatifa no vidro da janela. Daniel começa a correr em direção á sua casa. O portão da casa do vizinho se abre. Daniel tropeça no meio fio e bate o queixo no chão.
Um monstro que anda usando pernas e braços, como um gorila raivoso, veio em direção á Daniel. A última lembrança do garoto é a de ser puxado pelo asfalto, segurado pelos pés. Daniel se lembra de dentes afiados, grunhidos e uma baforada quente em seu rosto.