-Aquele
pessoal do check-in é muito mal educado, jogaram minha mala de qualquer jeito,
espero que não quebrem meus perfumes, nunca que encontrarei no Brasil um
perfume como aquele, gosto muito de perfumes.
Ao
olhar para trás, a jovem Jolene ficou surpresa. Uma mulher que devia estar
chegando aos cinquenta lhe dirigia a palavra querendo socializar. A jovem, sem
resposta pronta, não queria ficar em silêncio para não parecer rude com a
mulher. Porém, a surpresa do ato fez com que respondesse:
-Sim,
sim, percebo que a senhora cheira bem!
Oh
deus, porquê querida Jolene respondera daquela forma? A mulher que já era
carente, agora entendia isso como um elogio, trataria Jolene com mais carinho
com que trata suas próprias filhas.
-Esse
é um Shalini, realmente maravilhoso. Vejo que é uma moça bem comportada e de
bom gosto. – Jolene respondeu com um sorriso simpático e cordial- seu rosto me
lembra minha filha mais nova, você é muito bonita mesmo. Reconheci que é
brasileira pelo chaveiro na bolsa. O que faz na França?
De
fato, Jolene tinha pendurado na bolsa um chaveiro que misturava as bandeiras
dos dois Países, formando uma bandeira cortada na diagonal, com a bandeira
Brasileira á direita, a Francesa à esquerda.
-Eu
vim para visitar uma irmã que faz douturado aqui, aproveitando para conseguir
matrícula em uma universidade.
-Nossa,
mas que interessante” – A senhora
exclama enquanto tira o chapéu,
mostrando seus cabelos pintados de loiro -
O que vocês fazem, você e sua irmã? Fui professora de Genética por muito
tempo em uma universidade carioca, até que encontrei um marido rico. Será que
esse embarque demora? O avião vai se atrasar, e nós nem estamos no Brasil.
Antes
que a jovem respondesse, um movimento chamou atenção das duas um pouco mais a
frente da fila de embarque. Um homem mais velho, alto, corcunda e careca,
discutia em inglês com um rapaz de camiseta de animé japonês. Ao que tudo indica, o velho estava incomodado
com o fato do rapaz assistir a um vídeo no celular, sem usar fones de ouvido. O
velho teria batido na mão do jovem, derrubando o celular, e eles teriam um
grudado no pescoço do outro. Agora, outras pessoas separavam os dois enquanto
um policial e um dos seguranças do aeroporto vinham correndo de longe.
-Mas
que infortúnio! Nem parece que estamos na Europa!
-Sim, sim. – Respondeu jolene.
-Mas
você ainda não me disse o que fazem você e sua irmã.
-Ela
estuda química na Pierre Marie Currie, eu estou tentando entrar na Bourdeaux,
uma pós graduação de medicina.
-Jovem,
bonita e culta. Você é uma mulher de causar inveja, me lembra minha juventude,
eu só não era tão bonita – Disse a senhora, dando uma piscadinha nada discreta
e um sorriso de boca aberta – Mas ainda assim, graças a Deus, consegui amarrar
meu marido. Veja só, aqueles dois irão se matar!
Os
homens voltavam a discutir alto, em inglês. O segurança do aeroporto tentava
apaziguar a situação enquanto o policial já parecia ter perdido a paciência. Um
clamava o direito de não ser perturbado, o outro pedia o direito de proteção a
bens privados. As duas brasileiras assistiam em silêncio. Conforme o policial
retirou os homens, a fila andou dois passos e uma funcionária do aeroporto
começou o embarque.
-Sempre deixo meus documentos a mão nessa bolsinha, nunca se sabe. Assim posso
deixar tudo na mala de mão e poupar tempo no detector de metais.
-Sim, sim. Eu também.
-Como
queria que minhas filhas fossem como você.
A fila
andou mais um pouco. Jolene passou pelos detectores de metal sem impedimentos e
entrou na sala de embarque. Logo veio a mulher. No avião, estavam separadas. Ao
lado de Jolene se sentou um homem que dormia com a gravata afrouxada para
respirar melhor.
“Sras. e Srs., solicitamos que afivelem cintos de segurança. À partir
deste momento é proibida a utilização de qualquer equipamento
eletrônico. “
Cansada da viagem, Jolene cochilou assim que o
avião decolou.
“temos algum médico a bordo? Repito,
temos algum médico a bordo?”
Jolene se inclinou para a frente, ainda sem
entender o que acontecera. Uma aeromoça demonstrou interesse enquanto a jovem
levantava a mão.
-Eu sou médica!
-Que bom!, tem uma senhora passando mal na
primeira classe.
A primeira coisa que a médica fez ao se aproximar,
foi pedir espaço e tirar o chapéu da senhora., revelando seus cabelos loiros.
Jolene passou a mão pelo rosto de sua colega de fila. Ela suava frio, respirava
com dificuldade.
-Ela reclamou de dores no peito e formigamentos
- Disse a aeromoça, trêmula.
Jolene abriu a blusa da senhora e pôs a mão no
peito. O coração batia fervorosamente. Arritmia Cardíaca. Ela tinha um infarto.
-Tente ficar calma, senhora. Converse comigo.
Alguém tem duas aspirinas? Qual seu nome?
-Elizabeth, minha filha. Me chamo Elizabeth.
-Preciso que a senhora fique calma, tente
respirar tranquilo. Converse comigo
Alguém chegou com aspirinas, mas a essa
hora, Elizabeth começava a ter alguns espasmos estranhos. Jolene tentava
massagear o peito, mas de nada adiantava.
Subitamente sumiram os espasmos e a tremedeira, a respiração forçada deu lugar
a uma respiração lenta. Erguendo a cabeça para cima, Elizabeth soltou, junto
com seu último sopro, a frase “eu te amo”.
Jolene caiu em pranto no colo da mulher.