Bebia. Bebia porque preferia se afogar em álcool do que no
estresse da vida de empresário. Luís Valim bebia na cozinha de sua própria
casa. Saiu para a sala de estar, subiu as escadas da casa e entrou em seu
quarto. Uma das paredes do quarto era inteira de vidro, e o luar iluminava todo
o ambiente: uma porta para o closet ao lado de uma porta para o banheiro, a
cama, uma estante, a esposa dormindo descoberta.
Valim sentou-se na cama, esfregou com as mãos a barba
malfeita, passou pelo peito e apertou o próprio pênis, tudo mirando a esposa
vinte anos mais nova que ele. Abaixou, sentiu o cheiro do cabelo dela e
deitou-se ao lado da mulher, apalpando-a na bunda e os seios.
-Luís, o que você está fazendo? Eu estou dormindo.
-Não precisa acordar.
-Você está fedendo à cachaça, sai!
-E você fedendo à buceta.
-Luís, eu não
quero! – A mulher se debate.
-Cala a boca,
porra!
Então, Luís
ergueu a camisola da mulher, puxou a calcinha dela para o lado e a penetrou ao
mesmo tempo que a beijava no pescoço.
“Ai Luís” é
tudo o que ouviu a filha mais nova do homem, quando abriu a porta do quarto.
-Papai! O
michel está lá embaixo, chapado, e quebrou a mesa de centro da sala.
-Isso é hora,
menina! Vai dormir! – Valim berrou levantando-se.
O homem vestiu
seus calções, acompanhou a filha até o quarto e a mandou dormir. Ele mesmo
fechou a porta do quarto da menina, e ainda de pau duro desceu as escadas que
davam para a sala de estar. Lá, encontrou o filho de 19 anos deitado ao chão
com uma garrafa de vodca enfiada no vidro da mesa de centro.
-Levanta!
O homem puxou
o filho pelo braço até que se pusesse em pé, e o conduziu com dificuldade até a
cozinha da casa.
-Seu demônio!
Você vai apanhar tudo o que não apanhou quando era criança! Pra aprender a ser
homem. Eu já te disse que não quero você dentro dessa casa, maconheirinho
desgraçado. Se quiser continuar se
drogando, vai ter que ir embora. Você é maior de idade e eu não tenho mais
compromisso algum com você.
Luís pegou uma
escumadeira metálica presa na parede, e começou a chicotear o garoto.
-Você vai
pagar por tudo o que você fez para a sua mãe. Você matou a sua mãe. Você é uma
encarnação do próprio demônio
Por muito
tempo o garoto permaneceu jogado ao chão, levando golpes de escumadeira até
sangrar por todo o corpo. Luís percebeu que poderia matá-lo se continuasse.
Furioso, o
homem voltou á sala de estar e subiu as escadas, de volta para o quarto, para
libertar o resto de sua raiva na mulher.
...
-Ouvi dizer
que nossa sala já foi o almoxarifado da delegacia. -Disse Gaston.
Gaston era um
policial, detetive, rechonchudo e baixinho. Só vestia camisas. Seu bigode
sempre me fez pensar que ele era mais adequado à uma delegacia de um filme de
comédia estadunidense do que á uma delegacia brasileira. Eu imaginava Gaston
com suspensório e comendo rosquinhas, falando inglês e sendo chamado de tira.
-Aqui estão! –
Gaston abriu minha gaveta e guardou um par de algemas.
-Se o Garcia
descobre que você pega minhas algemas para satisfazer a piranha da sua esposa,
nós dois estamos fodidos. Falando na velha, ela continua gostosa?
-Continua
cuidando da senhora sua mãe. Por falar no homem, o Garcia pediu pra você ir pra
sala dele assim que chegasse.
Ao abrir a
porta da sala do delegado Garcia, senti o usual cheiro de cigarro. Sim, era
proibido fumar ali, mas já eram nove da noite e quem, dentro de uma delegacia,
reclamaria com o delegado?
-Diga-me, que
motivos eu teria parar tirar o sossego do grande detetive Herculano Pacheco.
-Garcia balançava o cigarro com o lábio.
Sim, meu nome
é Herculano Pacheco. Um nome forte demais, para um homem de aparência frágil.
Sou nada mais que um detetive ordinário, um solucionador de problemas, mais
especificamente, um solucionador de crimes.
Homens como
Garcia me consideram genial, por poder decorar informações que eles nunca
buscaram. Assista documentários e filmes desconhecidos, leia os livros que
ninguém gosta e então gente como o Garcia, mesmo que numa patente mais alta que
a sua, te considerará superior.
Outra coisa
que aprendi com Garcia, é que depois de um elogio sempre vem um pedido.
-Pois bem,
homem! Tenho um caso que só você é capaz de resolver. Há não mais de duas
horas, um homem chegou dizendo que encontrou a namorada morta na cama dele.
-E?
-Não é um caso
de violência doméstica comum. A ex-esposa dele também foi assassinada.
-E você tem
certeza, que não foi ele quem matou?
-Me deixa
contar a história inteira. O homem tem uma filha e um filho, o filho é usuário
de drogas e foi um traficante amigo dele que matou a primeira mulher. Tanto o
menino, quanto a menina estavam na casa quando a mulher morreu.
-Só os dois?
-Ainda espero
pelas imagens de câmeras de segurança da casa, e outras informações. Mas parece
que ninguém entrou na residência.
-Como ela
morreu?
-Um corte no
pescoço.
Fiquei quieto,
olhando para o chão. Aproximei a mão da boca e Garcia quebrou o silêncio.
-O mais
importante Herculano, é que você não é o encarregado desse caso, eu estou te
mandando cuidar dele de forma não oficial, porque não acredito que Gaston possa
resolver, e sinto que tem algo maior envolvido nessa morte. Talvez seja só
paranoia minha, mas enfim! Não pense que estou te enchendo com trabalho extra,
você fica sem caso nenhum por uma semana, se resolver esse.
-Pois bem! Eu
irei.
Uma semana de
folga, era tudo o que eu precisava para trabalhar em meus ditos projetos
pessoais. Se o que se sucedeu não tivesse me perturbado por meses.
...
Cheguei no
local do crime às nove e meia da noite. Precisava ser rápido para sair antes
que Gaston chegasse. A casa era maior que eu imaginava, e presumi que Garcia me
escondera algumas informações. No portão da casa, dois policiais impediam que
jornalistas curiosos entrassem. Ignorei os curiosos, mostrei as credenciais, e
para a tristeza da imprensa, passei sozinho pelo portão.
Um breve
caminho passava por uma varanda e levava até a porta da casa, onde dois grandes
amigos me esperavam. Ivan, o médico legista da delegacia onde trabalho e um
perito chamado Miguel.
-Mostrem-me o
que encontraram, amigos.
Ivan me guiou
pela sala, onde estranhei que a mesa de centro estivesse sem a tampa de vidro.
Subimos as escadas, e ao abrir uma porta do segundo andar, os dois me mostraram
o cadáver da mulher na cama.
-Olhe bem para
ela. Parece que nem acordou, morreu sem lutar.
Olhei ao
redor. O quarto parecia em ordem, nada fora do lugar. Apenas a mulher morta em
cima da cama e uma mancha de sangue no lençol.
-E a arma do
crime?
-Venha comigo.
– Disse o perito.
Descemos as
escadas, até o quarto do garoto. Lá dentro, pôsteres de bandas punk, grupos de
rap e mulheres nuas estampavam as paredes e a porta. O perito abriu uma gaveta,
e dentro dela, por baixo de um guardanapo, escondia-se um punhal pequeno,
manchado de sangue.
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